À Laia de Balanço do País dos Incêndios, Pós 25 de Abril.
- Luis Manuel Silva

- 9 de set.
- 9 min de leitura
Com o 25 de Abril, vieram os 3 Dês do Conselho da Revolução: Democratizar, Descolonizar, Desenvolver. Quais foram os resultados práticos, os prós e os contras, no decurso dos 25 anos que se seguiram?

Os principais contras foram a Reforma Agrária e as Nacionalizações.
Os prós foram o Serviço Nacional de Saúde, a Democratização do Ensino, a Habitação e Saneamento Básico, a Condição da Mulher e Família, a Emigração e o Retorno, a Liberdade de Expressão e a Cultura.
Na Habitação e Saneamento Básico conseguiu-se acabar com os grandes bairros de lata em Lisboa, Porto e periferias— a fazer lembrar as favelas da América Latina —, a habitação precária, sem condições, na generalidade do país; promoveu-se o acesso a água, eletricidade e saneamento; criou-se o serviço de apoio ambulatório local, SAAL, para promover a autoconstrução, com apoio de engenheiros e arquitetos.
Na Condição da Mulher e Família, retirou-se a tutela da mulher ao marido, promoveu-se a igualdade de direitos para homens e mulheres, estabeleceu-se o direito ao divórcio, eliminou-se a distinção entre filhos legítimos e ilegítimos, promoveu-se a igualdade de salários entre homens e mulheres.
A Emigração e Retorno, principalmente os regressados, retornados, de África, colocou ao país novos desafios de integração e alojamento. Com eles, vieram novas competências, mentalidades abertas e cosmopolitas. Foi um abre olhos para a sociedade fechada e conservadora do país.
Na Liberdade de Expressão e Cultura, foi estabelecido o fim da censura nos livros, jornais, filmes e teatro; promoveu-se a cultura.
Em 25 anos, Portugal, ávido por conforto e conhecimento, solidário com uma classe política culta, ideologicamente comprometida com as necessidades de uma nação que nada tinha, ainda que com altos e baixos, conseguiu fazer muito com a ajuda de homens visionários como Mário Soares, Freitas do Amaral e Soares Carneiro, que com a ajuda de homens tão ou mais cultos do que eles, estavam igualmente comprometidos com as necessidades do país e o todo popular. À semelhança de outros momentos históricos, tínhamos os homens certos no momento certo para conseguir fazer e resolver.
Infelizmente, também tivemos homens que venderam a agricultura, as pescas e as indústrias, deram início à desertificação do país, mandaram sair da zona do conforto jovens, desempregados e até professores. São os custos da falta de visão na Democracia.
Se nos primeiros 25 anos muito se fez: deixamos de ser um país analfabeto para passar a ter uma juventude instruída e tecnicamente qualificada — infelizmente, com todas as portas de acesso ao sistema produtivo nacional fechadas; nos segundos 25 anos, depois de algum enriquecimento e estabilização, passamos a ser confrontados com problemas económicos e sociais crescentes e fomos acordados para a realidade de um crescimento anémico da economia, com implicações várias.
O Baixo Crescimento e Produtividade foi o resultado da falta de investimento em investigação e desenvolvimento, a dependência de sectores económicos de baixo valor acrescentado, a burocracia pesada, os grupos sociais e profissionais elitistas e protetores de classe, como os funcionários estatais e as ordens profissionais de peso na ordem do país: advogados, médicos, professores…
No Défice e Dívida Pública verificou-se a permanente imperícia para o controlo orçamental e a incapacidade para reduzir a dívida, uma das maiores da europa. O alto endividamento limita os investimentos em áreas essenciais como a saúde, a educação e as infraestruturas.
O Peso Fiscal, a Burocracia e a Justiça funcionam como um sistema complexo. Tanto a Carga Fiscal como a Burocracia são obstáculos aos investimentos e ao empreendedorismo, desencoraja as empresas e os cidadãos. A Justiça lenta e dispendiosa trava a atividade económica e promove a injustiça.
A Pobreza e Desigualdade nos rendimentos de trabalho, em vez de gerar a riqueza, promove a pobreza. O trabalho precário, os salários indignos, o custo de vida elevado e a habitação, são aceleradores de pobreza que atinge milhões de pessoas.
A Habitação e Aumento do Custo de Vida faz disparar os preços da habitação, que ficou inacessível para a maioria da população. A especulação imobiliária, o investimento estrangeiro e a falta de políticas de habitação eficazes provocaram uma grave crise habitacional.
O Envelhecimento e Emigração provocou a inversão da faixa etária, devido à emigração de jovens e à baixa natalidade. O país envelhece rapidamente e coloca pressão na saúde, na segurança social, na sustentabilidade económica de longo prazo.
O que urge resolver.
Promover o Crescimento e a Produtividade: atrair investimento para setores de alto valor acrescentado, simplificar a burocracia para as empresas e apostar na inovação e na qualificação da mão de obra.
Distribuição de Riqueza: aumentar os salários.
Política de Habitação e Serviços Públicos: intervir no mercado imobiliário, investir nos serviços públicos de qualidade, como a saúde e a educação.
Demografia: o combate ao envelhecimento e emigração passa por melhorar as condições de vida e trabalho dos jovens, criar salários justos e oportunidades de carreira para que não sejam obrigados a gerar riqueza nos outros países.
Território: ordenar o território, fixar as poucas populações residentes, atrair os jovens e naturais, reflorestar o território com espécies resilientes, ensinarem e incentivarem, coercivamente, se necessário, as populações a gerirem os terrenos com produtos que criem riqueza a curto, médio e longo prazo, suportados por investimentos estatais a fundo perdido, com especial atenção aos incêndios, principal fonte de empobrecimento das populações, de enriquecimento dos grupos económicos.
Incêndios em Portugal nos últimos 25 anos
2003: 425000 hectares em todo o país: Principais regiões atingidas: Algarve, Beira interior, serra da Estrela. Um dos maiores foi o de Nisa, Portalegre, que galgou para Castelo Branco e Coimbra; o outro fogo devastador passeou por Monchique.
2017: duas vagas de incêndios: Junho, Pedrógão Grande, com 66 mortos; Outubro, maior que o de Pedrógão, nas regiões de Viseu, Coimbra e Aveiro, com 40 mortos.
2018: o maior de todos foi no Algarve: Monchique, Silves e Portimão
2025: falta fazer o balanço.
Estes, os maiores, para além dos outros que lavraram todos os anos, um pouco por todo o país.
Pessoas e entidades com autoridade na gestão científica das florestas e fogo
Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF):
Universidades (especialmente as ligadas a engenharia florestal):
Associações de Produtores Florestais:
Liga dos Bombeiros Portugueses:
Destes, destacam-se:
Domingos Xavier Viegas: professor universitário, especialista em ciências do fogo, estudou o incêndio de Pedrógão e produziu um relatório importante e decisivo para a tomada de medidas políticas.
José Miguel Pereira: professor de agronomia e investigador de ecologia aplicada, tem experiências práticas com décadas de estudos sobre os incêndios em Portugal. É um profundo conhecimento científico de fogos e florestas, com recomendações sucessivas e urgentes para a mudança do modelo de gestão do território.
Tiago Oliveira: engenheiro florestal, primeiro presidente para a gestão integrada de fogos. Essencialmente prático, traduziu as medidas políticas em planos de ação, coordenando-os no terreno. Foi o primeiro a criar estratégias de prevenção e combate.
António Bento Gouveia: presidente da liga dos bombeiros, traduziu a voz dos operacionais e foi um profundo e influente crítico para a escassez de recursos e excesso de burocracia. Em vez do combate ao fogo, insistia numa estratégia eficaz de gestão do território.
Gonçalo Ribeiro Telles, estudos e considerações técnicas.
A floresta não é uma monocultura: crítico, recusa chamar floresta a uma única espécie, como os eucaliptais; uma floresta é um ecossistema diversificado que garante o equilíbrio e a saúde da paisagem; considera que a monocultura é de baixo valor ecológico e é o combustível perfeito para os grandes incêndios.
A paisagem como um todo: Desde sempre defendeu a floresta como um mosaico interligado com floresta, áreas agrícolas, pastagens e faixas de água; a sua visão fez escola e nos anos mais recentes é a base de uma política de reordenamento do território que garante a descontinuidade da propagação do fogo.
O valor da agricultura e do interior: considerava que a desvalorização da agricultura e o abandono do interior eram responsáveis pela degradação da floresta; a floresta não devia ser separada das atividades humanas, garantir um interior vivo e confortável, ligado a atividades de conforto e produção diversificadas, agricultura e pastoreio, entre outras, é a única forma de garantir a gestão e proteção da floresta.
Lei do eucalipto: foi um acérrimo crítico da proliferação do eucalipto e lutou por uma lei, enquanto deputado, para condicionar o seu plantio. O principal argumento era que os interesses económicos de curto prazo comprometiam seriamente uma visão de longo prazo para o país.

Que propõem para prevenir e reordenar o território?
1 Reordenamento da Paisagem (Multifuncionalidade):
Mosaico Florestal: quebra de monoculturas, descontinuidades, faixas de gestão de combustível, com mistura de espécies inflamáveis com outras mais resistentes ao fogo (sobreiro e carvalho, entre outras), criação de faixas agrícolas, pastagens, cursos de água, que funcionem como barreiras quebra-fogo naturais.
Emparcelamento e Gestão Agregada: criar áreas de gestão integrada dos terrenos florestais fragmentados que dificultam a gestão e limpeza, criar programas de emparcelamento e ordenamento para facilitar a gestão eficiente, de escala, da floresta.
2 Prevenção e Gestão de Combustível:
Limpeza da Floresta: limpeza e gestão do combustível em faixas de proteção em torno das casas e povoados. Prática do fogo controlado feito por técnicos especializados para evitar os grandes fogos maiores e descontrolados.
Monitorização e Fiscalização: promover e reforçar a fiscalização para garantir que a limpeza está a ser cumprida; implementação de tecnologia com drones e satélites para detetar atempadamente um foco de incêndio.
3 Valorização Económica da Floresta:
Diversificação e Valorização de Produtos: a monocultura do eucalipto, rentável, é particularmente vulnerável ao fogo, por isso deve ser criteriosamente controlado o seu plantio. Valorizar e diversificar a produção, investindo em produtos de valor como a madeira, a cortiça — sobreiro —, os frutos florestais — castanha, pinha, noz… —, que convertem a floresta economicamente viável e menos arriscada.
Apoio a Produtores: apoios financeiros e programas de apoio de incentivo aos pequenos e médios produtores florestais para investir na gestão sustentável dos terrenos.
Que fazem os políticos diante dos relatórios produzidos?
Depois disto, e com tanta informação prática e científica de gestão do território e combate ao fogo, pergunto: que é preciso fazer para encontrar políticos cultos, humanistas, humildes, com espírito de missão, para se juntarem e discutirem o país a 10, 15, 25, 50 anos?
Será assim tão difícil gastar menos, produzir mais, encontrar bons gestores, ou será necessário chamar gestores como os belmiros, os jerónimos martins, os amorins e afins?
Porque não se limitam os políticos, tecnicamente ignorantes, corrosivamente teimosos nas suas propostas, a estabelecer metas e objetivos políticos, de acordo com as recomendações técnicas de gentes de saber, conceituadas inteligências nas respetivas áreas?
Porque não deixam os técnicos fazerem aquilo que melhor sabem: gerir, rentabilizar, corrigir em cada uma das áreas do seu saber, em vez de desfazer o que está bem ou mal feito, implementados pelos governos anteriores, perdulários no faz e desfaz?
Será o ego dos políticos mais importante do que criar riqueza no país, preservar o que temos, melhorar as condições de vida dos nossos compatriotas?
Quando desfazem as políticas anteriores, que pretendem obter com isso, empobrecer o país, enriquecer os clientes, criar tachos para a família e os amigos, perpetuarem-se nos comandos do destino do país como uma classe reinante hereditária?
Com tantos erros e mordomias, já vi quem vai ganhar as eleições para a Républica e a governação. Infelizmente, o ónus do desbarato governativo nestes últimos 25, 35 anos não vai recair sobre eles: os ratos são os primeiros a fugirem. Nós por cá ficaremos para aguentar.
Entretanto, devemos estar gratos ao governo por tudo quanto tem feito nos bastidores das praias e festas do Pontal, no Algarve.
O país está em guerra, mas a descoordenação é total, as lideranças estão ausentes, os fogos cavalgam as florestas. No entanto, garantem-nos que os povoamentos e as vidas das populações são poupadas com evacuações programadas e forçadas… Felizmente, quem resistiu e enfrentou o fogo, à falta de bombeiros ineficazes, à espera de ordens, conseguiu salvar os bens. Depois deste drama, não devemos ser injustos: salvamos a Pátria!
Por onde anda a comunicação social e os comentadores que ajudam e sancionam os políticos, em vez de educarem e informarem com isenção?
Para terminar, remeto para a releitura, mais acima: Que propõem para prevenir e reordenar o território?
Eu proponho, que para além disso, ouçam as populações, não os autarcas, que mais não são do que figuras exóticas e decorativas que ficam bem em qualquer concelho. Se os governos são culpados por falta de políticas, os autarcas são mais culpados porque vivem no laxismo das presidências contra as populações, por inércia na concretização de medidas agregadoras que dispensam o poder central. E quando não fosse possível fazerem mais e melhor, pelo número, 308 concelhos, e no interesse das populações, deveriam mobilizarem-se e atuarem como uma força dinâmica de pressão, junto dos governos, para gerarem políticas de interesse comunitário integradas num todo nacional.
Os poderes centrais têm culpas nacionais; os locais, porém, são mais culpados por não conseguirem dialogar com as populações locais. Quase sempre, são forças de bloqueio dos seus munícipes, com proibições de afirmação de autoridade para impedir de fazer. Prometem ajuda, quando se precisa de ajuda, esquecem-se de que estão ali para resolver e ligam o complicómetro. Seria bom que fossem menos partidários e mais regionais. Aliás, seria bom que fosse criada uma lei a impedir os partidos de concorrerem aos municípios.




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